Amy Winehouse se foi e, desde que foi divulgada a notícia da morte da cantora inglesa, no último sábado (23/07/2011) os sites, blogs, jornais, revistas, emissoras de rádio e TV se apressaram em colocar "no ar" especiais, entrevistas, homenagens e demais parafernálias já previsíveis para esse tipo de ocasião. E pra variar, de uma hora pra outra, (quase) todo mundo se tornou fã incondicional e passou a "reverenciar" a grande artista que, sem dúvidas, ela foi. Grande no sentido de ser diferenciada em relação a outros "ídolos" que a cada dia a mídia cria e mata, sem se preocupar em jogar os vestígios para baixo do tapete.
Winehouse também foi um produto fabricado. Basta comparar o som que ela fazia no primeiro disco, "Frank", com o que se ouviu no segundo trabalho em estúdio, "Back to black". Dos vocais, aos ritmos, passando pelas fotos que aparecem nas capas e todo o conceito dos arranjos dá pra perceber que algum "engenheiro" passou pela vida dela, percebeu que ela tinha um pé no jazz retrô de 40, 50 anos atrás, e o outro na capacidade autodestrutiva.
Confesso que quando ouvi Amy pela primeira vez identifiquei nela laivos de Billie Holyday, em "At Last", e de Anita O´Day, em "Sweet Georgia Brown". Guardadas as devidas proporções, Amy poderia ter se tornado uma diva caso sobrevivesse aos primeiros anos da pressão dos fãs, tablóides, gravadoras e outros personagens que ajudam a destruir o artista e construir o mito em quem investem seus sonhos, frustrações e desejos. É aquela famosa curiosidade mórbida de ter prazer em ver o artista no fio da navalha, na beira do abismo, a caminho do que Robert Plant tão poeticamente canta como as "Starway to heaven".
Produto fabricado ela foi, mas ao menos foi fiel ao "Viva intensamente e morra jovem", tantas vezes cantado e levado às últimas consequências pelos astros do rock. Sendo filho do diabo, como também dizem ser o blues, o rock é uma estrada de excessos que cobra um pedágio caro, na maioria das vezes a vida de seus filhos. Foi fiel por amar a música e os palcos e se recusar a fazer o jogo dos tablóides, dos holofotes, das falsas aparências. Desse confronto entre o aqui e agora e o amanhã incerto, sobrou o ser humano sensível, frágil, viciado em álcool e drogas e incapaz de suportar as agruras e falsidades do mundo globalizado.
Amy foi original, mesmo com aquele personagem que tentaram impor sobre a grande cantora. Aquelas perucas, aquela maquiagem pesada, aqueles vestidos, pareciam ser obra de algum marqueteiro que farejou, antes de todo mundo, uma mina de ouro naquela voz firme e rasgada, nascida junto com todas as grandes do blues e do jazz. Por um tempo o cara faturou, só não esperava que a "festa" acabaria tão cedo. Tirando o personagem tosco que nela tentaram impor o que sobra? Um diamante ainda em processo de lapidação, mas já com brilho único e visceral.
Me refiro à máscara quando lembro de nomes como Lady Gaga, Beyoncé, Rihanna, Britney Spears e, no Brasil, Restart e Maria Gadú. Tirando a pirotecnia, os (d) efeitos especiais, os bilhões gastos em marketing e os golpes publicitários para se promoverem a qualquer custo na mídia, o que sobra para esses "artistas" estrangeiros? Resposta: a ilusão, o vazio e o nada.
Quanto aos nacionais, experimente botar os 4 "restarts" num palco sem aquelas roupas coloridas, aqueles óculos sem lentes e sem aquelas caretas que costumam fazer para fotos e me digam o que acontece. Alguém aí consegue lembrar de um único "sucesso" e cantarolar uma frase dos caras? Deixa pra lá, perda de tempo e raciocínio. E a Gadú? Coloquem ela sem aquele visual "muderno" num palco pra ver o que acontece. Só mesmo o Caetano, batendo nos 70, pra cantar a tal da "Shimbalaêi" (É assim que se escreve?) e dizer que é "linda".
Mas dei toda essa volta porque, quando tive a idéia de escrever essse post, milhares de "críticos musicais" pularam na frente a citaram a tal da "maldição dos 27" que é, segundo os "especialistas", a idade fatal para os verdadeiros e grandes artistas. Até agora já citaram Jim Morrison, Janis Joplin, Jimi Hendrix, Kurt Cobain e agora Amy Winehouse.
Pois aproveito pra acrescentar Brian Jones (gênio da guitarra e fundador dos Rolling Stones) e Jean-Michel Basquiat que, apesar do nome francês, era norte-americano e um dos grandes artistas plásticos dos últimos 50 anos. Basquiat não era músico, mas as telas que pintou "cantam" e, só de olhar, dá pra "ouvir" os riffs que cada um dos quadros transmite. Pois bem, a tríade sexo, drogas e rock´n´roll levou também esses dois aos 27 anos e o mito sobre os dois algarismos ganhou mais dois nomes de peso.
Se há alguma relação, ou "maldição", como queiram, entre as mortes dos ídolos e a idade em que se foram, isso já é mais um produto criado pelo fanatismo. Mas que bate aquela curiosidade em saber como a turma que passa dos 27 e chega aos 67, como é o caso de Mick Jagger (que já tem 68) e Keitih Richards, ou aos 87, como chegou Anita O`Day, ah, isso bate. Nesses três casos, a bola bateu na trave milhares de vezes e só não estufou as redes porque não quis. As da Amy, para o bem ou para o mal, já foram estufadas e bem mais cedo.
Câmbio, desligo.
Sérgio Augusto
Editor da Academia da Palavra
Foto: divulgação